Massacre de Cunhaú e Uruaçú - Onde está a verdade?



A data de 3 de outubro é feriado no Rio Grande do Norte, em comemoração ao Dia dos Mártires de Uruaçu e Cunhaú. Mais um feriado… e santo! O  impressionante é quando analisamos os porquês do feriado. Entro um pouco mais fundo na “história” por que a “estória” de Cunhaú me intriga. O povo só conhece um lado da moeda… aquilo que “alguns” insistem em contar.O que na verdade aconteceu? Foi realmente um massacre? Faço aqui a defesa do outro lado, baseado em pesquisa histórica.  Vejamos então a outra versão dos fatos. Esse massacre, diz a “história”, foi cometido por ordem do governo holandês no Recife e orientados por um pastor “calvinista”. 

Não pretendo aqui minimizar as mortes, a crueldade do evento. Mas apresentar outros fatos que foram inapropriadamente usados para culpar um outro grupo estrangeiro de uma religião (protestantes) diferente da majoritária. Quero apresentar em três pontos algumas observações importantes: 

1 – É preciso entender (ou buscar na história laica) que não foi o governo holandês que ordenou a chacina. Na verdade, a outra versão que fazemos aqui o levante, narra que foi uma vingança por parte dos índios que ali moravam ajudados por uma outra tribo da Bahia. Todos esses, se revoltaram devido notícias da crueldade cometidas pelos portugueses para com os indígenas. No início da revolta (13/6/1645), isso é aceito pela maioria dos historiadores (laicos) que por onde passavam os portugueses e estabeleciam seu domínio, a violência, a morte estava presente de forma cruel. Os “brasilianos” (como eram chamados os índios tupis) fugiam para bem próximo das fortificações holandesas, que eram difíceis de serem atacadas e destruídas. Outros decidiram evitar o desastre aparentemente inevitável e pegaram em armas. Foi isso que aconteceu em Cunhaú. 

“No Rio Grande do Norte, a população indígena consistia em grande parte de índios antropófagos (tapuias), sob a liderança do seu cacique Nhanduí. Para os holandeses, os tapuias significavam um bando de aliados um tanto inconstantes, pois eram um povo muito independente, que não aceitava ordens de ninguém, mas decidia por si o que era melhor para sua tribo. Um tal de Jacob Rabe, casado com uma índia, servia de ligação entre eles e o governo holandês”. (Schalkwijk – 1986).

Os holandeses eram considerados como os libertadores da opressão portuguesa. E, por várias vezes, esses índios quiseram aproveitar-se da situação de derrota dos portugueses para vingar-se da violência anterior como acontecera no Ceará em 1637, em 1645 os índios procuraram matar todos os portugueses da região, que foram protegidos pelos holandeses, por meio das armas.. Os tapuias sentiram que, com o início da revolta contra os holandeses, eram eles ou os portugueses. No dia 16 de julho, começaram por Cunhaú, massacrando as pessoas que estavam na capela e posteriormente, numa luta armada, os restantes. 

2. O nome do Pastor protestante Rev. Jodocus à Stetten que era capelão do exército holandês está ligado a esse episódio de Cunhaú, é preciso observar e entender que exatamente o contrário do que alguns afirmam, esse pastor foi enviado pelo governo holandês do Recife para acalmar os ânimos dos indígenas. Porém, os índios, não entendiam como os holandeses podiam defender seus inimigos mortais. 3 . É preciso também registrar que esse sim: Como afirma Schalkwijk, o Algoz-mor de Cunhaú: Jacob Rabe alguns meses depois do massacre, esse funcionário da Companhia das Índias Ocidentais, que havia recebido o pastor Jodocus de pistola em punho, foi morto por ordem do próprio governador da capitania do Rio Grande do Norte, Joris Garstman. O capitão Joris era casado com uma senhora portuguesa que havia perdido muitos parentes em Cunhaú. Na história não podemos eleger nossos heróis, mas os inimigos, o algoz, sempre queremos descobrir que o foi. Nesse relato, apresentamos uma outra versão que evidentemente não esclarece de um todo, mas apresenta através de três pontos que a história precisa ser revista. 

Não queremos aqui minimizar o massacre, o sofrimento das vidas que foram perdidas naquele local. Isso foi verdadeiro, mas devemos ser honestos com a história, não cedendo a pressões religiosas mais deixando a liberdade de pesquisa, de imprensa, registrar a outra face não contada. Esse caso de Cunhaú é extremamente controverso. Mas reina uma versão aceita pelos leigos e por alguns intelectuais que não buscaram conhecer o outro lado da história. Se na história não podemos eleger nosso herói, não podemos afirmar sobre o bandido, como a “versão” autorizada afirma que foi culpa do governo holandês orientado por um Pastor Evangélico. A história relatada por Cascudo e demais historiadores que defendem que o massacre foi obra do governo holandês tem uma razão de ser, bem como a minha história.

A verdade, somente a verdade deveria reinar em um lugar que (para alguns) é solo sagrado, hierofânico e místico.


João Bosco de Sousa – Escritor, Teólogo protestante de confissão pentecostal e Cientista da Religião pela UERN. ( Nordestino, nascido em Natal sem familiares holandeses ou calvinistas). (tomando como base o texto de Francisco Schalkwijk – Doutor em história na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. É autor do livro Igreja e Estado no Brasil Holandês (1986).